TEMA 1010: entenda o que muda com a decisão do STJ para construções próximas a cursos d’água e as implicações para o meio ambiente e proprietários de residências da região.
Muitos temas relacionados a construções em áreas urbanas próximas a cursos d’água tramitam no poder judiciário. Na maioria dos casos, as discussões sobre os efeitos no meio ambiente são defendidas pela Lei de parcelamento de Solo Urbano ou pelo Código Florestal.
Para tentar solucionar a controvérsia, o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) julgou, no final de abril, recursos especiais nos quais se discutiu a distância que deveria ser mantida de um curso d’água localizado em área urbana consolidada: os 15 metros previstos na Lei de Parcelamento do Solo Urbano (Lei Federal 6.766/79) ou os 30 metros do novo Código Florestal (Lei Federal 12.651/12).
Optou-se, em síntese, pelo último: nas áreas de preservação permanente de qualquer curso d’água, perene ou intermitente, em trechos caracterizados como área urbana consolidada, deve-se respeitar o disciplinado pelo novo Código.
Claro que cada município e corpo hídrico detém suas particularidades, que devem ser observadas com cautela e consideradas pelo Poder Público quando analisadas, mas o tema chamado de 1010 tem causado polêmicas, sobretudo em nossa região, rodeada de mata nativa, fauna e, inclusive, recursos naturais.
Para o engenheiro civil Diego Pires, pós-graduado em segurança do trabalho e especialista em projetos arquitetônicos residenciais, industriais, para corpo de bombeiros e vigilância sanitária no município de Cotia, uma mudança na lei buscando a preservação do meio ambiente era necessária para manutenção de obras que oferecem riscos à natureza, principalmente quando próximas aos cursos d’água.
“A mudança tem o intuito de proteger o meio ambiente e os recursos naturais. Áreas de Preservação Permanente (APP) devem ter um controle do que é construído ao redor, sendo proibido explorá-las para atividades econômicas ou que agridam essa área de alguma forma”, comenta.
Nós do Escritório Ricardo Monteiro Advogados ,estamos acompanhando os reflexos da decisão do STJ acerca do tema. A advogada Fernanda Fonseca Petiz faz parte da equipe e pontua que a mudança é importante para uma região como Cotia, mas que uma análise individual de cada caso poderia ser mais interessante em edificações que precisam ser “adequadas” às novas regras.
“Para as hipóteses de regiões urbanas consolidadas, não sendo o caso de áreas de interesse ecológico relevante ou situação de risco ao meio ambiente, entendemos que é importante ser admitida uma análise mais flexível, considerando nesta avaliação que a adequação pode trazer mais prejuízos ao meio ambiente que a não alteração da área edificada”, diz.
Para novas edificações, as intervenções em áreas urbanas deverão respeitar uma faixa que varia entre 30 a 500 metros próximas de cursos d’água. Enquanto os imóveis que já se encontram dentro das áreas agora irregulares podem passar por novos procedimentos judiciais, a fim de se adequarem ao recuo estabelecido.
Para a também advogada Aline Coutinho Silva, essa medida não foi devidamente pensada no meio ambiente quando define o que deve ser preservado ou restaurado:
“considerando a adequação integral ao que foi determinado, algumas cidades já consolidadas no país estariam integralmente em área de preservação, pois a urbanização e o avanço social ocorreram em áreas que demandariam recuo de até 500 metros, tornando impossível respeitar a lei sem causar grande impacto na região, comércio e sociedade”.
No que diz respeito ao que as mudanças dessa decisão podem significar na prática, as especialistas acreditam que outros conflitos podem aparecer quando as pessoas tentarem adequar seus imóveis às novas regras. De acordo com elas, esse é um assunto novo e que ainda pode render muitas discussões.
“Entendemos que a decisão não causará pequenas mudanças, mas sim, uma grande e conflituosa discussão acerca da real aplicabilidade da lei na região urbana estudada. Podendo, inclusive, derivar significativa onda de ‘judicialização’ da questão devido à insegurança jurídica causada nos casos em que o Poder Público, fundamentado na Lei de Uso e Ocupação do Solo, concedeu autorizações e licenças a antigas edificações. A questão é nova e ainda trata outras vertentes, visto que prédios e outras construções públicas também estão passiveis de inadequação”, dizem as advogadas.
As questões debatidas não são somente pela importância de haver um controle e cuidado com os efeitos de se construir próximo a cursos d’água, mas sobretudo em como a gestão dessa lei pode prejudicar o meio ambiente. O engenheiro Diego Pires diz que, independentemente das controvérsias, é importante haver esse diálogo, assim como mudanças na prática para a manutenção adequada dessas áreas, uma vez que toda a população será beneficiada por um espaço ecologicamente equilibrado.
“Não é interessante morar próximo de rios por vários motivos como enchentes, insetos, etc. O meio ambiente, juntamente com a população, ganha em qualidade de vida quando acontece a preservação da área de APP. Esses espaços preservados são essenciais para que os animais se movam e se reproduzam”, defende.
Para ele, através de mudanças como essa, é possível que o poder público de cada município possa fiscalizar e garantir proteção de rios e áreas de vegetação nativa, o que não significa deixar fazer melhorias nas áreas urbanas consolidadas ou ajustes quando essas já estiverem próximas a cursos d’água. “A manutenção da vegetação das APP transforma as cidades em um ambiente agradável a partir da diversificação da paisagem com o acréscimo de elementos naturais ao cenário urbano, garantindo à população cidades mais sustentáveis”, conclui.
Dúvidas frequentes
O que é um APP?
Área de Preservação Permanente é uma área protegida, em regra com vegetação nativa e função ambiental de preservar os recursos naturais.
A construção que foi regular e em área urbana ainda terá de se adequar ao Código Florestal?
Sim. Havendo edificação às margens d’água que possua função ecológica, deverá observar o Código Florestal.
Como prevenir a insegurança jurídica ambiental?
A avaliação técnica e jurídica deverá ser específica a cada caso, considerando a adequação ou judicialização da questão.
Por: Aline Coutinho Silva e Fernanda Fonseca Petiz